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O que é que os lucros dos bancos nos dizem?

Diretor-adjunto António José Vilela

ONovo Banco (NB) foi o último dos grandes bancos instalados em Portugal a divulgar as contas do ano passado. E adivinhem lá qual foi o cenário depois de anos de má publicidade pelas heranças do passado e uma ajudinha de empréstimos do Fundo de Resolução avaliados em €3,4 mil milhões? Pois, a contabilidade tornou-se cor-de-rosa: foram quase €561 milhões de lucros, o triplo em relação ao ano anterior.

Os magos financeiros da Comissão Executiva do NB preparam-se agora para receber alguns milhões de bónus (lá se chegará para o ano, mas ainda não há distribuição de dividendos por causa das obrigações do Fundo de Resolução) e já se sabe que o banco conseguiu fazer mais de €293 milhões em comissões, ainda assim longe daquilo que amealhou o campeão das comissões bancárias, o Millennium BCP, com quase €772 milhões (e lucros de €208 milhões).

Também o banco público, a Caixa Geral de Depósitos, atingiu o patamar da quase excelência, não por estar prestes a passar os custos da mastodonte sede para o Governo, mas pelos lucros de €843 milhões, um crescimento de 45%, ou seja, metade da subida percentual do Santander que por sua vez elevou os gráficos dos lucros para perto dos €569 milhões.

Igualmente pródigos nos resultados positivos foram o BPI e o Montepio. O primeiro atingiu os cerca de €365 milhões e o segundo ficou-se pelos quase €34 milhões. Feitas as contas globais, e mesmo tendo em conta que mais de 700 funcionários desapareceram do balanço e foram fechados 115 balcões, convenhamos que é muito dinheiro limpinho. Um lucro médio a aumentar 70% e um valor total de cerca de €2,5 mil milhões. E isto num ano marcado por uma guerra que há muito não se via, pelos restos de uma epidemia mortal, pela inflação galopante e por uma política monetária que é tudo menos amiga da generalidade dos portugueses.

Pode-se sempre argumentar (como alguns doutos fazem) que ter bancos saudáveis é meio caminho para uma economia saudável. E que é bom que os bancos ganhem dinheiro, porque senão todos temos de pagar (como já aconteceu vezes demais) para os salvar. Mas o problema de uma sociedade moderna nunca foi existirem setores extraordinariamente rentáveis, como acontece também com as petrolíferas, os produtores de energia, as empresas de telecomunicações e as grandes superfícies que controlam as vendas de alimentos. O problema é que há apenas um lado (e parece continuar a ser sempre o mesmo) que medra nos momentos de crise generalizada.

Por isso, ao Estado (mesmo com um Governo mais ou menos requentado) cabe a última e decisiva palavra para equilibrar o que precisa de equilíbrio, para defender e respeitar o vulgar cidadão (a maior parte de todos nós) que legitimamente julga que alguma coisa vai mesmo muito mal num país quando o seu dia a dia está virado do avesso nas idas ao supermercado, nos pagamentos dos empréstimos das casas, na remuneração dos depósitos e na forma como ouve dizer amiúde que não há dinheiro para reivindicações legítimas de professores e contínuos, de médicos e enfermeiros, de polícias e de maquinistas e de tantos outros.

Podemos ter todas as explicações micro e macroeconómicas para sustentar de forma objetiva e racional porque é bom viver numa sociedade com oferta e procura, em que o mercado livre deve imperar, mas nada disto interessa quando se trabalha e não se consegue pagar a renda, a luz, a água ou comprar azeite, couves e cebolas. ●

Do Diretor

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2023-03-16T07:00:00.0000000Z

2023-03-16T07:00:00.0000000Z

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