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A cidade não se quer deixar estagnar no slogan que lhe enobrece o Largo do Toural. Já todos sabemos que “aqui nasceu Portugal”, mas a identidade da região e do País continua a ser aprofundada na história, nas artes e à mesa. Fomos saber como.

Por Filipa Teixeira

Tudo o que há para conhecer na cidade de Guimarães

PASSAM 21 ANOS desde a elevação do centro histórico de Guimarães a Património Cultural da UNESCO (2001), 10 desde a Capital Europeia da Cultura (2012) e 894 desde a Batalha de São Mamede (1128), o ato de rebelião que culminou com a independência de Portugal. A tentação de cair na nostalgia é grande, mas a cidade-berço não se prende ao passado. Há muito que vai desbravando o futuro.

C DE GUIMARÃES

Passear hoje pelas suas ruas é sentir uma inquietude saudável, assente em parte nos pilares da criatividade, ciência, conhecimento e cultura. “Lembro-me de ser criança, passar por aqui e não haver peixes na água”, diz Paulo Lopes Silva ao caminhar pela Travessa do Rio de Couros. Naquele estreito corre um fino fio de rio, que hoje já vai dando sinais de vida, depois de décadas a engolir os resíduos da atividade têxtil. A indústria dos curtumes na região, lembra-nos o vereador da Cultura de Guimarães, tem raízes medievais.

A narrativa bate de frente com o edifício da Universidade das Nações Unidas, que, em 2015, ao virar da Travessa, instalou ali o polo de Governação Eletrónica. Várias épocas entrecruzam-se aqui, na zona de Couros, e isso é a força vital do projeto Bairro C, que visa aproximar esta zona, outrora marginal, ao centro histórico. Há em Couros mais de 15 unidades industriais, algumas delas transformadas em polos de conhecimento, como a Fábrica de Curtumes Âncora, casa do Centro Ciência Viva de Guimarães, onde também encontrará vários núcleos com tanques de curtimenta e o recém-recupe

A câmara já oficializou junto da UNESCO o pedido para alargar à zona de Couros o perímetro classificado como Património Cultural

rado Teatro Jordão. Agregado à Garagem Avenida, o teatro é hoje a Escola de Artes Visuais, Artes Performativas e Música da cidade e oferece sete salas de ensaio para bandas de garagem locais. “Foi aqui que surgiram projetos já consolidados como os Toulouse, Paraguaii ou Unsafe Space Garden”, nota o vereador.

REPENSAR O MUSEU

Daqui até ao Centro Internacional das Artes José de Guimarães (CIAJG) é um pulo, mas antes de o visitarmos tivemos tempo para comer um preguinho na Tasca do Tio Júlio (€5). É bom, mas não tem a modernidade e a variedade da Pregaria, que oferece 27 variações do tradicional prego no pão (a partir de €6,90). Independen

temente da escolha, o acertado é acabar a refeição na Confeitaria Clarinha e provar a torta de Guimarães (€2,20). A massa ainda é feita à mão por Rosário e a filha Mariana e demora entre 24 a 30 horas a atingir o ponto perfeito.

Mais à frente voltaremos à comida. Agora é tempo de apagar as velas do 10º aniversário do CIAJG. “Resolvemos fazer uma programação que refletisse e assinalasse esta década”, refere Marta Mestre, diretora artística do centro. No exercício de “pôr o museu a pensar sobre si mesmo”, enquadra-se o ciclo “Voz Multiplicada”, que até 18 de setembro põe cinco exposições em diálogo com as coleções de José de Guimarães. Entre elas está a coletiva Garganta, com curadoria de Raphael Fonseca e A Língua do Monstro, onde o artista almadense Pedro Barateiro propõe uma renovação do vocabulário do museu. É uma espécie de exercício transformista, que atravessa os campos da identidade, da resistência social e política e do autoquestionamento artístico, que tem tanto de antropológico como de futurista, sugerindo a quebra de ciclos como quem muda de cara, ainda assim sem deslaçar a memória de cada corpo, seja de museu ou de homem.

A MEMÓRIA LIGA TUDO

O futuro não se constrói se a memória for apagada e, não por acaso, uns metros abaixo do CIAJG está a Casa da Memória de Guimarães. É sábio começar a visita à cidade por ali, nem que seja para aprender expressões locais, como “cachicha!” (algo que repele) ou “vou ali afiar a espada” (vou ali e já venho). Mais para o centro encontrará a Loja Oficina, ideal para comprar um souvenir genuíno, da cantarinha namoradeira (a começar em €5 ) ao bordado de Guimarães (a partir de €8,25).

No centro histórico, perca-se nas ruas estreitas até encontrar um largo amplo, seja o da Oliveira ou o de S. Tiago, os mais carismáticos, ou o do Serralho, mais modesto e morada escolhida por António Loureiro para montar a sua Cozinha. Foi em festa que o chef de 53 anos ali recebeu, em 2018, uma estrela Michelin. “É nossa”, vibraram os vizinhos. Este sentimento de comunidade está muito presente dentro e fora deste restaurante sustentável, que tem o mote do “desperdício zero”.

À mesa poderá optar por um de dois menus de degustação: o Caminhos (€120), que explora sabores de várias geografias, e o Minho (€105), focado na região e em que se destaca a reinterpretação da pescada poveira e da galinha de domingo e ainda o cheirinho a santos populares da tartelete de tomate, sardinha e pimento.

RELAXAR NAS TAIPAS

Depois de tanto caminhar e provar, é justo darmos descanso ao corpo. Pegue no carro e vá até às Caldas das Taipas, vila termal que se tem modernizado nos últimos anos. À parte a zona de tratamentos, focada em doenças do foro respiratório, dermatológico e esquelético, o complexo tem um spa especializado em massagens de relaxamento. Há programas de um e de dois dias, que podem incluir duche Vichy, massagem com chocolate, lama ou pedras quentes ou esfoliação corporal (a partir de €35).

As terapias tiveram origem nos Banhos Velhos, no século XVIII, parte do complexo com vestígios romanos, atualmente desativada para tratamentos, mas com nova vida cultural: Bruno Pernadas (12 de agosto), Manel Cruz (11 de setembro) e Samuel Úria (17 de setembro) vão lá dar concertos e, pelo meio, há cinema ao ar livre. ●

O ciclo “Voz Multiplicada” cruza obras do angolano Yonamine e Max Fernandes com manifestos de José de Guimarães e uma coletiva

Sumário

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2022-08-11T07:00:00.0000000Z

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