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ESTE MAUSOLÉU É O MAIOR DA EUROPA

A sua dimensão e riqueza arquitetónica estava ao nível da importância de D. Pedro Holstein Beck. É um monumento que se destaca no cemitério dos Prazeres.

Por Sónia Bento

O1º duque de Palmela, D. Pedro de Sousa Holstein, propôs à câmara de Lisboa a construção de um jazigo num terreno seu contíguo ao cemitério dos Prazeres, para ser integrado depois no próprio recinto. Em contrapartida, cedia à autarquia o que restasse para ampliar o espaço cemiterial. A obra iniciou-se em 1846, sob orientação do cenógrafo italiano Giuseppe Cinatti, um destacado maçom, que ficou famoso pelos cenários de peças nos teatros São Carlos e no D. Maria II.

Em 1849, surge um mausoléu de inusitada escala, em forma de pirâmide inacabada, com 12 metros, e que ainda hoje é o maior monumento funerário da Europa. Essa obra única na arte tumular portuguesa do século XIX é uma espécie de cemitério privado, dentro do dos Prazeres – o mais elitista de Lisboa, com sete mil jazigos. Licínio Fidalgo, historiador e coordenador daquele cemitério, abriu as portas do mausoléu à SÁBADO e explicou: o terreno sobrelevado procura afirmar a distinção dos Palmela, existe um portão próprio e o esplendor arquitetónico manifesta a aspiração a um lugar privilegiado no reino de Deus, segundo as crenças da época.

A dimensão do mausoléu atribui-se à importância do duque de Palmela, que foi uma das figuras mais influentes do liberalismo – embaixador de Portugal em várias cidades europeias. Exerceu por diversas vezes

A OBRA INICIOU-SE EM 1846, SOB ORIENTAÇÃO DO CENÓGRAFO GIUSEPPE CINATTI, DESTACADO MAÇOM

o cargo de ministro dos Negócios Estrangeiros e de presidente do Conselho de Ministros, no reinado de D. Maria II. Quando D. Pedro de Sousa Holstein morreu, a 12 de outubro de 1850, aos 69 anos, o jazigo já guardava três mortos da sua numerosa família, um deles a mulher, D. Eugénia Francisca Xavier Teles da Gama.

Criados enterrados no jardim

Alguns especialistas afirmam que o mausoléu conjuga, no seu exterior, vários símbolos ligados à maçonaria, por influência de Cinatti, já que ao duque não se conhecia nenhuma ligação àquela sociedade secreta. Exemplos: o empedrado de losangos da alameda de acesso ao jazigo, as colunas que evocam o templo de Salomão ou os sete degraus da entrada (o sete é um dos números simbólicos para a maçonaria). A capela e o jardim de ciprestes estão rodeados por um gradeamento constituído por peças repetidas em conjuntos de três – no centro de cada peça está a cabeça de um leão, símbolo de poder e outra marca de inspiração maçónica. No topo da pirâmide, destaca-se a estátua de uma figura feminina, identificada como o “Anjo da Morte”, da autoria do escultor Francisco de Paula de Araújo Cerqueira, que também fez o altar da capela. A mulher segura um livro e umas chaves, numa alusão a São

Pedro, a quem Jesus Cristo entregou as chaves do Paraíso.

No jardim estão inumados os restos mortais dos criados dos Palmela. Os membros da família encontram-se sepultados na capela e na cripta, no piso subterrâneo. Na entrada, do lado direito, temos a obra de arte mais notável do mausoléu: o cenotáfio do pai do duque de Palmela, D. Alexandre de Sousa Holstein, que está sepultado em Roma, feito em mármore de Carrara pelo escultor italiano Antonio Canova.

Em frente, fica o altar, com castiçais e uma Bíblia aberta, e em cada um dos lados há duas arcas tumulares em pedra. A da esquerda é o de D. Maria Luiza Noronha Teixeira de Sampayo e do marido, D. Domingos de Sousa Holstein, segundos duques de Palmela. A arca tem um baixo-relevo, de António Teixeira Lopes, que representa a enfermaria de um hospital (a duquesa fundou a Sociedade de São Vicente de Paulo e outras instituições de beneficência em Portugal).

O túmulo da direita é o da terceira duquesa de Palmela, Maria Luísa de Sousa Holstein e do marido, António de Sampaio e Pina Brederode, visconde de Lançada. É ornamentado por uma escultura, também de Teixeira Lopes, que é uma figura de uma mulher tombada, que representa a dor de D. Maria Luísa por ter perdido o filho, de 3 anos. Em cima da arca está um anjo grande, que segura uma cruz, e dois mais pequenos – um deles apresenta o sexo masculino,

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O 1.º duque de Palmela casou-se com D. Eugénia Francisca, em Lisboa, em 1810, e tiveram 15 filhos

podendo ser a personificação desse menino, uma vez que “os anjos não têm sexo”. Do lado esquerdo do altar, há uma porta coberta por outra escultura, em mármore, de uma mulher em sofrimento, de Célestin Calmels. Aí está sepultado o filho da terceira duquesa de Palmela, D. Pedro Maria de Sousa Holstein Beck, que por não ter chegado a ser duque teria de ser enterrado, o que a mãe não suportou, tendo optado por deixar os restos mortais da criança na capela, junto ao túmulo dos avós e mais tarde do dela.

Visitas guiadas ao mausoléu

O acesso à cripta é feito através de um lance de escadas, onde está o túmulo de D. Pedro de Sousa Holstein e da mulher. Ali, só podiam ficar os corpos dos duques de Palmela até à quarta geração. O teto amarelo tem desenhadas papoilas-dormideiras, que simbolizam o descanso eterno. Na cripta, estão sepultados cerca de 180 corpos, não só dos Palmela, mas de pessoas próximas da família, caso do artista francês Célestin Calmels, amigo e professor de escultura da terceira duquesa de Palmela. À volta da câmara, há um corredor com gavetas de pedra, que guardam dezenas de caixões.

A reconhecida importância desta obra ímpar da arquitetura funerária levou D. Manuel de Sousa e Holstein Beck, 4º conde da Póvoa (falecido em 2011) a doá-lo à Câmara de Lisboa, em 1997, que hoje é responsável pela sua conservação. Quem quiser conhecer o mausoléu dos Palmela tem uma visita guiada uma vez por mês. “Os mais interessados são estudantes universitários, espanhóis e sobretudo brasileiros, que vêm em busca das suas origens”, explica Licínio Fidalgo. ●

NO TOPO DA PIRÂMIDE HÁ UMA ESTÁTUA DE UMA FIGURA FEMININA, IDENTIFICADA COMO O “ANJO DA MORTE”

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2022-08-11T07:00:00.0000000Z

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