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NA MINHA TERRA COM...

No seio de uma família operária, o deputado liberal cresceu com uma bola nos pés. Gritava à porta de Fernando Couto e foi defesa central dos Morgados. As aventuras (e boleias na bagageira) do parlamentar.

Por Alexandre R. Malhado

...Carlos Guimarães Pinto. A nova rubrica da SÁBADO arranca com o deputado da Iniciativa Liberal e a sua viagem às memórias de infância em Paramos, Espinho

Em 1995, a vida de uma criança em Paramos, concelho de Espinho, andava entre a escola e os jogos de futebol que se faziam na estrada. A baliza era feita de pedras, a bola era a que se arranjava e as equipas compunham-se pelos miúdos que apareciam. No caso de Carlos Guimarães Pinto, que vivia numa rua repleta de casas construídas pelos cinco tios maternos, jogava com primos, amigos e com quem quisesse. “Até se juntava malta de um bairro de barracas ali perto”, recorda à SÁBADO. Os pontapés na bola só paravam para abrir alas aos carros que iam passando ou quando os pais chegavam das respetivas fábricas e era hora de jantar.

O futebol foi uma parte da pacata infância do deputado liberal. A primeira memória, que admite ser “algo difusa”, foi quando o FC Porto ganhou a Taça Intercontinental, em 1987. Tinha 4 anos. “Lembroos -me da casa antiga e de ver o jogo com a neve na televisão”, recorda. Além da bola no asfalto, passava a vida na praia com os amigos, em festas filarmónicas com a família e, como se espera de um economista, a fazer contas de Matemática na escola. “No 12º ano, tive a melhor nota do concelho, 19,8. A minha namorada teve a segunda melhor, 19,6. Afinal, estudávamos juntos”, recorda. Não era visto como um marrão – “ao contrário disso, até achavam que eu passava sem estudar muito”. Um dos pontos altos do secundário eram as viagens de finalistas a Espanha, primeiro a Lloret de Mar e mais tarde a Salou. “Andávamos a poupar o ano todo 100 euros para ter dinheiro para a viagem.”

Autógrafos de Fernando Couto

No ciclo (5º e 6º anos), apanhava todas as manhãs o autocarro em Paramos para Espinho. Passava a viagem de 20 minutos a falar com

colegas, que iam no mesmo autocarro para a escola Domingos Capela. “Era a escola dos miúdos mais pobres, que nem cantina tinha. À frente era a dos mais ricos, a Sá Couto. Minutos antes de tocar para a hora de almoço, as nossas aulas acabavam e corríamos até à cantina dos meninos

“Acabei com a melhor nota do concelho a Matemática. A minha namorada ficou em 2.º ÍAMOS À CANTINA DA ESCOLA AO LADO E DEPOIS PASSÁVAMOS O INTERVALO FORA., SEJA NA PRAIA OU À PORTA DO FERNANDO COUTO

CARLOS GUIMARÃES PINTO, deputado da Iniciativa Liberal

ricos para comermos lá. Toda a gente sabia que éramos nós: estávamos todos suados.”

À hora do intervalo, viam-se fora da escola e podiam fazer o que quisessem. Ou iam à praia ou iam prestar uma visita a “um ídolo”. “Quem vivia mesmo em frente à nossa escola era o Fernando Couto [figura do FC Porto], um grande ídolo para os miúdos da altura. Quase todos os dias depois do almoço púnhamo-nos à porta de casa dele a berrar, a fazer uma festa e a pedir autógrafos. Lembro-me de o ver ainda umas duas vezes, sei que tenho uns quantos autógrafos dele lá por casa”, recorda. Curiosamente, Couto era defesa central, posição sempre assumida por Carlos Guimarães Pinto durante a adolescência no clube da terra, Os Morgados. “Era na brincadeira, o clube jogava no campeonato popular de Espinho. Eu não tinha muito jeito [para futebol], mas como era alto e forte tornei-me defesa central”, afirma.

Um dos elementos embutidos no ADN da família Guimarães é a música – e portanto, cresceu rodeado dela. “Muitos familiares meus tocam em bandas filarmónicas, da Marinha e de heavy metal. Eu ainda tentei com vários instrumentos, de piano a percussão, sopro, mas falhei com todos”, conta. O avô foi o apogeu desse fenómeno: Joaquim Guimarães, multi-instrumentista da filarmónica União Musical Paramense. Tocou durante mais de 70 anos e a sua especialidade era o clarinete e deu concertos até morrer. Até a escola de música da terra foi batizada com o seu nome.

Carlos Guimarães Pinto viveu em Paramos até concluir o curso de Economia na Universidade do Porto. Fazia todos os dias Porto-Paramos. “Como no primeiro ano não tinha carta, fazia a viagem de comboio. Depois lá fiquei com o carro antigo do pai”, recorda-se. Era um carro de dois lugares, mas aproveitava a bagageira para dar boleia aos colegas. “Acho que já passaram anos suficientes para o crime prescrever e posso contar isto”, disse, em tom de brincadeira.

Livre desde pequeno

De pequenino é que se torce o pepino, reza o ditado. Aplica-se ao deputado liberal, que desde tenra idade procurou o seu espaço de independência. “Os meus primeiros anos de vida foram passados numa casa fraquinha. Aos bocadinhos, os meus pais (com a ajuda dos vizinhos/familiares) foram construindo uma casa boa no terreno da família. Lembro-me de quando o meu quarto ficou pron- to, instalei-me logo lá – apesar de não haver eletricidade ainda. O meu tio ficou pressionado com aquilo e acelerou a instalação da eletricidade.”

O deputado nasceu no seio de uma família operária: a mãe, numa fábrica têxtil, o pai, na indústria do papel. Como os pais trabalhavam até tarde e faziam muitas vezes horas extras, era Carlos Guimarães Pinto que ia sozinho para o infantário, localizado a 400 metros de casa. “Sempre quis ser livre.”

Hoje, vive em Vila Nova de Gaia e visita com frequência a mãe, ainda em Paramos. Na terra, o destino do parlamentar não é surpresa. “Nas aulas de História, quem discutia era eu. Nem que fosse a pedido dos colegas para arrastar a aula.” ●

“Tentei [tocar] vários instrumentos, de piano a percussão, sopro, mas falhei com todos

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2022-08-11T07:00:00.0000000Z

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