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Comunicação

Quando o diretor de informação saiu da TVI (onde contratara Medina para comentar), foi ele próprio, logo a seguir, contratado pela CML através de uma empresa que acabara de criar.

Por Marco Alves

As relações entre Fernando Medina e Sérgio Figueiredo

Achegada do antigo diretor de informação da TVI ao Ministério das Finanças é o mais recente capítulo da relação de Sérgio Figueiredo com Fernando Medina: é a terceira vez que um contrata o outro. Uma dessas operações não era ainda do conhecimento público. Mas antes de a revelar é necessário seguir o fio à meada.

A primeira “contratação” foi da responsabilidade de Sérgio Figueiredo. Acabado de assumir a direção de informação da TVI, o jornalista contratou Fernando Medina para ser comentador no canal no verão de 2015. Medina era há poucos meses presidente da Câmara Municipal de Lisboa (CML) depois de António Costa, de quem era o número dois, ter saído para se candidatar a primeiro-ministro.

Nunca foi divulgado quanto é que a TVI pagava a Medina, mas em 2019 um artigo da SÁBADO sobre os comentadores políticos das televisões revelava que o autarca, em 2017, declarara €40.680 de rendimentos dos media, nos quais estava a TVI e uma coluna de opinião no Correio da Manhã, entretanto extinta. Medina auferia cerca de €2.500 por mês na televisão, um pouco menos do seu salário na câmara, que rondava os €3.500 líquidos. A colaboração de Medina na TVI só seria interrompida em 2022, com a sua entrada no governo como ministro das Finanças.

Sérgio Figueiredo fez um percurso diferente. Saiu da TVI dois anos antes, em julho de 2020, e tornou-se “freelancer”, como diz a sua página profissional do LinkedIn. Logo depois de abandonar a estação, Sérgio Figueiredo foi contratado pela própria CML de Fernando

Medina, o que não era ainda do conhecimento público.

Oficialmente, a câmara abriu uma Consulta Prévia para “aquisição de serviços de desenvolvimento de produção de uma campanha de comunicação destinada aos estabelecimentos de comércio tradicional a retalho e de restauração e bebidas, no âmbito do Plano de Apoio Económico e Social”.

Não está referido no Portal Base dos contratos públicos quais foram as empresas (a lei exige pelo menos três nos procedimentos de Consulta Prévia) que a CML auscultou no mercado para fazer a adjudicação. A CML não respondeu em tempo útil a este pedido de informação da SÁBADO, ainda que a nossa revista o tenha feito na tarde de terça-feira, em cima do fecho desta edição.

Espécie de Consulta Prévia

Certo é que ganhou a Plataforma Coerente, empresa de Sérgio Figueiredo: €30.000 por 20 dias. O contrato foi assinado a 10 de dezembro de 2020 e não consta do Base.

Pode na verdade não ter havido nenhuma Consulta Prévia, a ver pelo que Sérgio Figueiredo nos contou sobre os contornos da adju

A IDEIA FOI DE SÉRGIO FIGUEIREDO: “CHAMEI A ATENÇÃO DE FERNANDO MEDINA”, DIZ À SÁBADO

dicação: “Estávamos no segundo confinamento [2020], todos os dias fechavam lojas de bairro e chamei a atenção de Fernando Medina que não se salvava da falência aquela gente toda apenas com subsídios. Era preciso sensibilizar as pessoas para privilegiarem o comércio local nas suas compras de Natal.”

O projeto, diz ainda o antigo jornalista à SÁBADO, está no canal de YouTube da CML. “Foi uma campanha de promoção das compras de Natal no comércio local, no contexto da segunda vaga de Covid e esteve no ar nas três televisões em dezembro desse ano. Chamou-se Parte de Nós.”

A campanha consiste em blocos de depoimentos de figuras públicas. Terá a empresa de Sérgio Figueiredo contratado pessoas e alugado material que justifiquem os €30.000? Não. Os vídeos foram

A EMPRESA FOI CRIADA LOGO A SEGUIR A TER SAÍDO DA TVI E TEM MARGARIDA PINTO CORREIA COMO SÓCIA

filmados “pelos telemóveis das próprias figuras públicas envolvidas”, diz-nos.

Sérgio Figueiredo diz no entanto que o valor do serviço vê-se noutras coisas. “Há 20 e tal figuras públicas a dar a cara pela causa... isto não vale nada? Como acha que eles foram mobilizados? Se a CML tivesse de contratar aquela gente toda para o mesmo trabalho, faz ideia de quanto lhes custaria? Além disso, não gravei nada, mas tivemos de fazer edição (montagem, sonorização) de depoimentos. Foram produzidas dezenas de clips. Por quem? E a conceção da campanha? Os copys? Enfim…”

A empresa em causa, a Plataforma Coerente, tinha acabado de ser criada, a 17 de agosto de 2020. Com sede em Lisboa e capital social de €5.000, é detida por Sérgio Figueiredo (70%) e pela atriz e jornalista Margarida Pinto Correia (30%). Tem como objeto social “atividades de relações públicas e de comunicação, produção de filmes, de vídeos e programas de televisão, atividades técnicas de pós-produção para filmes, vídeos e programas de televisão”, entre outros.

Fernando Medina não respondeu à mensagem da SÁBADO, que lhe pedia uma explicação dos contornos deste negócio. ●

Sumário

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