ESTAVA NO PICO da montanha mais alta da indústria. Depois de uma admirável sequência de álbuns em que demonstrava uma habilidade sem igual, Kendrick Lamar sagrara-se, indiscutivelmente, um dos mais relevantes nomes do hip-hop mundial, e, discutivelmente, sucessor de Tupac como figura maior do género. Aos 29 anos, provara ter o talento, a técnica, a notoriedade e, talvez acima de tudo, a consciência social para ser o líder que a sua geração buscava, mas justamente quando nos habituávamos a vê-lo nessa posição, respondeu-nos com silêncio.

Não um silêncio total, diga-se: no ano seguinte a DAMN. (2017), que, se dúvidas restassem, o coroou definitivamente, produziu a banda sonora do filme Pantera Negra, em que surge em três canções. Seria a última vez em três anos que o ouviríamos em qualquer canção – uma repetição do padrão do rapper, especialmente protetor da sua esfera privada, de se isolar do espaço público entre projetos artísticos.

Não esteve parado, no entanto: no mesmo ano, fez uma participação especial num episódio da série Power, de 50 Cent; em 2020, fundou a PGLang, uma empresa multidisciplinar que abrange “música, cinema, televisão, arte,

Aos 29 anos, Kendrick provou ter o talento, a técnica, a notoriedade e a consciência social para ser o líder da sua geração. Aos 34, dá continuidade ao trabalho com um disco duplo

livros e podcasts”; e, no ano passado, numa carta pública aos fãs, levantou o véu do que andava a fazer, incluindo “passar a maior parte dos dias com pensamentos fugazes”, “estar meses sem um telemóvel” e “produzir o seu último álbum da TDE” – a Top Dawg Entertainment, que o revelou quando tinha apenas 16 anos, e o elevou ao estrelato através do álbum de estreia, Section.80 (2011), editará também o novo registo.

Prometia ser uma despedida emotiva, mas antes ainda surgiu com destaque em The Melodic Blue (2021), o disco de estreia do seu primo, Baby Keem, causando ondas com o single Family Ties, vencedor de Grammy. Só a três semanas da chegada do disco chegou a confirmação da data do lançamento, 13 de maio, e do nome, Mr. Morale & the Big Steppers – à data de fecho desta edição, tudo o que sabemos sobre o disco, fora uma fotografia partilhada por Kendrick que sugere tratar-se de um álbum duplo.

É seguro, no entanto, esperar uma continuação do trabalho feito até agora: uma mescla dos hinos de pista de dança de good kid, m.A.A.d city (2012), a densidade narrativa e jazzística de To Pimp a Butterfly (2015) ou a raiva e contemporaneidade de DAMN. estarão, sem dúvida, entre os pontos fortes de um disco que promete ser um novo marco no hip-hop. ●