Figura da música popular portuguesa, foi membro fundador dos Tantra e ganhou o Festival da Canção de 1983 com Esta Balada Que Te Dou. Tinha 67 anos

Oanúncio foi feito pelo colega e amigo de décadas, Herman José, no Facebook: “O querido Armando Gama mudou-se esta noite para palcos mais celestiais.” Não foi apenas nos palcos, como intérprete, no entanto, que se destacou: enquanto orquestrador, produtor e compositor multifacetado, inscreveu o seu nome em diversos capítulos da história da música popular portuguesa, entre o rock progressivo, a pop e a música ligeira. Na reclusão imposta por uma denúncia pública de violência doméstica e sofrendo de cancro, morreu no passado domingo, dia 16, no IPO de Lisboa, onde estava internado.

Armando António Capelo Diniz da Gama nasceu em Luanda, Angola, a 1 de abril de 1954. O interesse pela música não tardou a florescer: aos 5 anos, já tocava harmónica, aos 7 começou a ter aulas de acordeão e, aos 14, começava a escrever as primeiras composições na guitarra. Em 1970, já a estudar piano e Teoria Musical na Academia de Música de Angola, forma a sua primeira banda, os LoveBirds, e no ano seguinte, enquanto metade da dupla Marinho & Gama, grava o seu primeiro disco, em que assina dois temas: Spanish Garden e Menino.

Chega a Lisboa em 1974, aos 20 anos, e do contacto que estabelece com a fervilhante cena musical da altura, que produziu marcos do rock progressivo nacional como Quarteto 1111, Banda do Casaco e Petrus Castrus, brota o seu primeiro grande contributo para a música portuguesa: com os Tantra, que forma com Manuel Cardoso, grava pela Valentim de Carvalho o LP Mistérios e Maravilhas, em 1977. Marcado pela complexidade musical, longas passagens instrumentais e teatrais apresentações ao vivo que ecoavam grupos como os Genesis, é hoje reconhecido como referência absoluta do género no País, e, na época, fez descolar a carreira de Armando Gama.

EM 2020, FOI DETIDO PELA GNR POR VIOLÊNCIA DOMÉSTICA, ACUSADO PELA COMPANHEIRA DE AGRESSÕES FÍSICAS

Do festival à violência doméstica

Prova disso é o facto de, no ano seguinte, já fora dos Tantra, ter assinado, a convite do produtor Tozé Brito, pela PolyGram, enquanto parte dos Sarabanda, dupla que formou com a cantora Kris Kopke. É com ela que faz a primeira participação no Festival da Canção, em 1980, com o tema

Made in Portugal, ficando em 5º lugar na primeira semifinal – acabaria por vencer José Cid, com

Um Grande, Grande Amor. No mesmo ano, inicia-se como produtor, trabalhando para nomes como Dina, Doce, Trio Odemira, Nicolau Breyner e Dino Meira.

Em 1982, pela Rádio Triunfo, estreia-se a solo com o disco Quase

Tudo, de que fez parte a canção com que venceria, no ano seguinte, o Festival da Canção: Esta Balada Que Te Dou, com arranjos de Mike Sergeant, tornou-se o seu maior sucesso, e as ondas da sua influência na cultura nacional sentem-se até hoje na música pop ou em séries de televisão, como Prisão Domiciliária, da Opto, onde, nos segundos iniciais do episódio de estreia, se discute o significado preciso das palavras do refrão. É também neste festival que conhece a primeira mulher, a apresentadora da RTP Valentina Torres, com quem seria casado por 26 anos e gravaria uma série de discos nos anos subsequentes. Tiveram dois filhos: Ana Carolina, em 1987, e António, em 1991. Participa novamente no Festival da Canção em 1992, com o tema Se Eu Sonhar, e mantém o fluxo constante de discos até à viragem do milénio, altura em que passa a dedicar-se mais aos espetáculos ao vivo: entre 1999 e 2008, atua regularmente ao piano no Casino Estoril e, a partir de 2009, no Palácio de Seteais. Fã fervoroso dos Beatles, apresentou, em 2006, o espetáculo Armando Gama, o Quinto Beatle, de versões do quarteto britânico. Mais recentemente, atuava, sobretudo em hotéis, a solo ou com o quarteto Revival.

Em 2011, aos 57 anos, conheceu Bárbara Barbosa, 34 anos mais nova, quando esta lhe pediu um autógrafo, e iniciou uma relação que produziu o seu terceiro filho, dois anos depois. A relação acabaria em tom amargo quando, em janeiro de 2020, Gama foi detido pela GNR por violência doméstica, acusado pela companheira de agressões físicas e um clima de coação psicológica. ●