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RIBATEJO EM PONTO REBUÇADO

A taberna ficou para trás e agora é só Ó Balcão. O restaurante de Rodrigo Castelo está de cara lavada e quer lançar-se em voos mais altos.

Por Sebastião Almeida

entramos no renovado Ó Balcão, em Santarém, começamos a entender o porquê de Rodrigo Castelo afirmar que a “taberna” caiu do nome do restaurante. O tom esverdeado das paredes é acolhedor; a garrafeira, que emoldura a abertura para o interior da cozinha, harmoniza as vistas. Da antiga taberna, restam os azulejos coloridos do balcão e o mosaico verde que ladeia todo o interior.

“A cozinha mantém a identidade, mas está mais evoluída tecnicamente”, explica Rodrigo Castelo, ao deixar na mesa um pequeno snack de camarinhas de rio (um camarão pequenino e crocante) que inicia o almoço.

É o último dia de agosto e há pouco movimento. Rodrigo é filho da terra e tornou-se cozinheiro “por instinto”. Abriu o agora Ó Balcão (que antes tinha taberna no nome) há oito anos e nele tem trilhado um caminho de evolução da sua cozinha, transformando-a para que o cliente se depare com “produtos com outra roupagem”. A atenção continua na matéria-prima local, não fosse o Ribatejo o maior fornecedor de onde retira toda a riqueza para o que serve.

É-nos proposto o menu de degustação (€75), composto por 14 momentos, em que o peixe de rio está em claro destaque. A quantidade de pratos pode assustar, mas

O Ó Balcão mantém a mesma identidade, mas está mais evoluído na técnica. Rodrigo Castelo lidera a transformação de um Ribatejo em estado bruto, à espera de ser depurado

tudo está pensado para chegarmos ao fim a sentirmo-nos bem, demorando no máximo duas horas e meia à mesa, garante o chef.

“Não vão comer o pão todo, não vão comer a manteiga toda. Reduzimos muito os hidratos e o glúten e pesamos a proteína”, diz-nos, depois de provarmos a broa de milho e a cecina (uma espécie de presunto obtido da vaca, através de uma técnica antiga de cura francesa).

Com o passar das horas, a sala compõe-se e ganha uma nova vida. O burburinho que a invade evidencia o entusiasmo dos comensais.

Depois de uma sopa de peixe do rio (lúcio, com cura de bacalhau, e ovas de barbo), chega um dos pratos que personifica a transformação que o chef aponta. É uma fataça, também conhecida como tainha, curada em sal para atingir a textura de um robalo, explica Rodrigo. É depois esfoliada em açúcar, para que os processos enzimáticos se deem mais rápido, detalha. Ao lado, uma barriga de porco malhado de Alcobaça, engordado com nozes. A inspiração comum é o mar, para dar textura aos peixes e um ponto de salga maior, pois o peixe de rio sabe quase sempre ao mesmo.

À medida que o almoço avança, a depuração das técnicas e dos sabores sobressaem em cada prato. Entre eles, há um fio condutor, diz Rodrigo. Falamos da acidez que interliga os pratos. “Sente-se um bocadinho em todos. Achamos que assim é como se estivéssemos a ver teatro. É o fechar do pano e vamos para outra peça”, continua. “A acidez na ligação dos pratos é como os vinhos – prolonga os pratos e lava a boca no final.”

Aqui, tudo “está mais redondo, harmonizado”, não hesita em dizer. E alguns dos restantes pratos que provamos, como os pezinhos de coentrada, o cremoso de caranguejo e lagostim de rio – à carta e no menu – já existiam, mas foram sendo trabalhados. “Em Coruche respira-se o Alentejo, em Abrantes respira-se a serra, temos o Zêzere e o Tejo. O Ribatejo estava em bruto, à espera de ser reformado”, admite. No novo Ó Balcão, Rodrigo lidera a revolução, sem demoras à mesa. W

Gourmet

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2021-09-23T07:00:00.0000000Z

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