Cofina

Coimas

Decidir em casos de racismo ou xenofobia – como o do cartaz no Seixal – cabe a apenas três pessoas. Não há atas das decisões, não se sabe como vota cada conselheiro nem a fundamentação. Por Maria Henrique Espada

MANDARAM O CARTAZ DO “ARROZ CHINÊS” À CNE

Quem toma as decisões na comissão para a igualdade?

Acarta registada chegou à sede do PSD Seixal, e o candidato Bruno Vasconcelos foi levantá-la aos correios. Foi a única interação com a CICDR (Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial), que enviou a carta. Tinha 10 dias para responder: houve duas denúncias à CICDR por “alegado tratamento discriminatório” no cartaz com Mao Tse Tung que dizia “Mao Mao Maria” e “Depois de 45 anos a comer arroz, vais votar nos mesmos de sempre?” As queixas à CICDR foram-lhe remetidas (embora nunca sejam tornadas públicas) e uma é de um particular, outra, aponta o candidato à SÁBADO, “de um senhor que é candidato do MAS, o que mostra que isto é mesmo só política”. Seja o que for, o candidato nada mais sabe sobre a queixa, a decisão da CICDR e como ela foi tomada.

E isso é, na verdade, o normal: a decisão de abrir ou não um processo por discriminação é tomada pela Comissão Permanente (CP) da CICDR. Ora, se a CICDR tem 32 membros, a sua CP tem só três: a presidente do Alto Comissariado para as Migrações, Cláudia Pereira, por inerência (designada em 2020 pelo Governo) e mais dois comissários, eleitos pelos outros membros; o jurista Manuel Macaísta Calheiros, de 81 anos, e o ativista Flávio Almada, da associação Moinho da Juventude, da Cova da Moura, também conhecido, como rapper, por LBC Soldjah.

Mas se é natural que a identidade dos queixosos seja salvaguardada, a verdade é que o resto do processo, que pode levar a coima ou admoestação, é bastante opaco. O teor exato das denúncias e o próprio processo de decisão não é escrutinável. Não há fundamentação pública ou atas das decisões da CP (a SÁBADO pediu-as), pelo que os argumentos e o sentido de voto de cada um é desconhecido.

CNE sim, processo ainda não

Sobre o caso do Seixal, a CICDR respondeu à SÁBADO que para já “não foi instaurado processo de contraordenação ou proferida acusação”, embora a CP tenha também enviado as denúncias para a Comissão Nacional de Eleições. E sobre as suas decisões, remeteu para os relatórios anuais de atividade, nos quais não há qualquer referência a votações na CP, nem justificação concreta para a opção, em cada caso, de abrir ou não um processo (prerrogativa que cabe à presidente) e multar, ou não, os visados.

A opacidade processual permitirá, por exemplo, que um conselheiro intervenha numa queixa colocada por uma associação a que esteja ligado. Questionada sobre este ponto – e sobre se já ocorreu – a CICDR esclareceu que “sempre que se verifique uma situação de impedimento” o visado é “substituído pelo membro suplente de modo a garantir a imparcialidade”. Mas não existe possibilidade de escrutínio externo sobre isso: não é público quem vota, como, o quê em concreto.

E nem todas as queixas levam à abertura de processo. No relatório de 2020, várias razões são apontadas para poder levar a esse desfecho, sendo uma delas (pp. 57) a possibilidade de a queixa ser “infundada”. No caso do “arroz” a queixa para já ainda não foi dada por infundada. Na resposta de Bruno Vasconcelos à CICDR, a que a SÁBADO acedeu, o PSD Seixal considera a notificação “completamente inaceitável, visto que, só com grande imaginação e uma visão completamente distorcida da mensagem” o partido refere que não “aceita o acolhimento dado por essa comissão a essas denúncias”. W

NO RELATÓRIO DE 2020, A CICDR CONSIDEROU “INFUNDADAS” ALGUMAS QUEIXAS

Sumário

pt-pt

2021-09-23T07:00:00.0000000Z

2021-09-23T07:00:00.0000000Z

http://quiosque.medialivre.pt/article/281608128578222

Cofina