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A DANÇA DE REGRESSO À GULBENKIAN

Com curadoria de João dos Santos Martins, o ciclo P de Dança mostra mais de 20 peças criadas na última década com apoios da Fundação. Para ver entre 24 de junho e 4 de julho nos auditórios da Gulbenkian.

Por Markus Almeida

para elaborar um programa que reunisse trabalhos apoiados pela Fundação Gulbenkian, João dos Santos Martins, bailarino, coreógrafo, editor, respondeu com o P de Dança, uma mostra de 22 peças – de entre mais de uma centena de artistas bolseiros do Programa Gulbenkian Cultura entre 2011 e 2017 – que decorre de 24 de junho a 4 de julho.

Desde que extinguiu o Ballet Gulbenkian, em 2005, a Fundação tem financiado projetos independentes de dança contemporânea.

“São projetos sistematicamente independentes, com pouca sustentabilidade financeira e sem instituições por trás, que é o contrário de como a maioria dos apoios estatais funciona”, conta João dos Santos Martins. “Alguns trabalhos são segundas, terceiras, quartas peças na vida desse artista. Também há uma relação de estranhamento com isso”, acrescenta.

Por não serem apresentadas há anos, as peças tiveram de ser reformuladas. Não é só carregar na tecla replay, até porque as criações estão “intimamente ligadas à biografia dos artistas”, que não estão no mesmo lugar em que estavam há cinco ou 10 anos. “Os objetos performativos são permeáveis à performance de quem os faz, o que implica um reposicionamento perante o que foi feito no passado. Por oposição às artes plásticas, são menos estáveis enquanto objetos.”

Museu Encantador (26/6, 16h30 e 27/6, 16h), de Rita Natálio e Joana Levi, foi apresentado no Rio de Janeiro, em 2014, quando Rita se tinha mudado para o Brasil. A peça nunca foi mostrada em Portugal. Filipe Pereira e Teresa Silva tinham saído do Fórum Dança quando criaram O que fica do que passa (4/7, 21h), em 2013,

Estas criações estão “intimamente ligadas à biografia dos artistas”, que não estão no mesmo lugar em que estavam há cinco ou 10 anos, explica o curador João dos Santos Martins

David Marques fez Kin (27/6, 15h) depois de um mestrado em Montpellier, em 2014, e, para dar só mais um exemplo, Aurora Pinho era recém-formada pelo Balleteatro, no Porto, quando se candidatou pela primeira vez a um apoio à criação, do qual resultou Velvet N’ Goldmine (24/6, 20h, em sessão dupla com Trovoada, de Luís Guerra).

No caso de Aurora, a clivagem é mais profunda: desde que estreou

“A dança é vista como uma prática expandida onde muitas coisas que não têm lugar nas artes plásticas ou no teatro encontram o seu espaço”

a peça, em 2016, a artista mudou de nome e de género. “Foi o gatilho para assumir publicamente que eu era trans”, recorda à SÁBADO sobre a peça que a ajudou a decifrar a “receção de um outro tipo de corpo, que é diversificado, não apenas queer, mas trans e não binária.”

A mudança de contexto leva, por um lado, a que estas peças antes apresentadas em espaços pequenos, com pouco público, conheçam agora alguns dos palcos mais simbólicos e importantes de Lisboa, perante um público que, acredita João dos Santos Martins, será muito distinto do que frequenta os espaços independentes.

Por outro, faz com que os artistas tenham de repensar os espetáculos confrontando-se com o seu posicionamento dentro do espectro das artes performativas hoje, por oposição ao passado.

“As pessoas que fazem parte deste ciclo não se relacionam necessariamente com a nomenclatura dança. No entanto, receberam apoios à dança e não ao teatro”, realça, “porque a dança é vista como uma prática expandida onde muitas coisas que não têm lugar nas artes plásticas ou no teatro encontram aqui o seu espaço”.

Ou seja, não espere encontrar bailarinos a dançar em pontas. “Não, não são seres esvoaçantes com música clássica”, diz, sorrindo. “Aliás, nem todos os espetáculos têm música.”

Consulte a programação completa em https://gulbenkian.pt/p-de-danca.

Dança

pt-pt

2021-06-24T07:00:00.0000000Z

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http://quiosque.medialivre.pt/article/282836489047375

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