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E se um ‘arrependido’ entrasse no jogo?

SE EXISTISSE EM PORTUGAL A POSSIBILIDADE DE NEGOCIAR O ARREPENDIMENTO DE ALGUNS DOS PERSONAGENS DOS PROCESSOS, COMO ESTÁ A ACONTECER NUM CASO IDÊNTICO NA BÉLGICA, AS CONSEQUÊNCIAS CRIMINAIS SERIAM DEVASTADORAS

Eduardo Dâmaso Diretor Geral Editorial Adjunto do CM/CMTV

çAo ler tudo o que tem sido publicado sobre as operações Cartão Vermelho, Prolongamento e Fora de Jogo, percebem-se várias coisas. A primeira é a forte coesão que existe entre a dupla investigadora. O procurador Rosário Teixeira e o inspector tributário Paulo Silva trabalham junto há praticamente duas décadas e têm hoje um conhecimento e uma informação brutais sobre os mecanismos do dinheiro sujo em Portugal, venha ele da alta finança, da manipulação de grandes projectos do Estado ou do futebol. São, seguramente, duas das pessoas mais poderosas do País.

Pelo que se conhece, Rosário Teixeira e Paulo Silva investigam casos muito consolidados contra Luís Filipe Vieira e os seus amigos dos negócios, mas também contra Pinto da Costa e a pandilha que o rodeia, que vai do inefável Pinho ao ‘soldado’ Madureira. Perseguindo o rasto do muito dinheiro negro que marca este processo, a dupla de investigadores tem grandes hipóteses de ver este conjunto de três casos transformado uma verdadeira operação ‘Mãos Lim- pas’ sobre o futebol português.

Percebe-se ainda que, face aos muitos indícios destes casos, se existisse em Portugal a possibi- lidade de negociar o arrependimento de alguns dos personagens dos processos, como está a acontecer num caso idêntico na Bélgica, as consequências criminais seriam devastadoras. Quando digo negociar, é negociar a sério e em sossego, sem que qualquer passo da investigação seja transformado numa bizarra polémica sobre direitos fundamentais, como se tivésse- mos uma justiça chinesa, com pena de morte e um vasto manual de torturas.

O ‘Footbelgate’, que esta sema- na acusou 56 dirigentes, empresários, jogadores e árbitros, envolvendo onze dos 18 clubes do campeonato belga, incluindo Brugge, Anderlecht, Standard de Liége e Genk, começou em 2018 e conseguiu um ‘arrependido’ precioso. O antigo jogador e agente desportivo Dejan Veljkovic, testa de ferro de uma sociedade cipriota que lavava milhões de euros das transferências e assegurava as comissões por baixo da mesa, foi preso em 2018 e decidiu colaborar. Foi tratado inicialmente como um mentiroso e efabulador, um erro crasso dos seus antigos clientes, e não aguentou a pressão prisional nem o arresto de bens próprios ou titulados por familiares.

Contou tudo o que sabia, viu as suas informações serem verificadas pela justiça, confirmadas na plenitude, e o processo andou. Com recurso a escutas, ao ‘arrependido’ e a uma rápida acção na apreensão e arresto de bens, o processo chega a tribunal em tempo recorde. Com respeito pelo dos direitos e garantias de defesa dos arguidos. A Bélgica não é um exemplo para Portugal? Não é um Estado de Direito Democrático?

OPINIÃO

pt-pt

2022-01-21T08:00:00.0000000Z

2022-01-21T08:00:00.0000000Z

http://quiosque.medialivre.pt/article/281736977828139

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