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Governo disposto a ceder mais no IRC

• Executivo acena com descida nas tributações autónomas • Proposta para atualizar escalões do IRS em 5,1% • Empresários pedem corte no IVA do golfe e apoios à internacionalização

HUGO NEUTEL hugoneutel@negocios.pt

Os setores são diferentes, mas há dificuldades comuns e, por isso, as associações empresariais mais representativas da economia convergem no apelo ao Governo para que o Orçamento do Estado inclua uma descida da carga fiscal, e em particular uma queda transversal do IRC.

O Executivo deu sinais contraditórios sobre a matéria, com o ministro da Economia, António Costa Silva, a admitir uma descida transversal, para ser de imediato corrigido pelo responsável pela pasta das Finanças, Fernando Medina. O que está neste momento em cima da mesa é uma descida seletiva do imposto, como forma de incentivo a aumentos salariais anuais de 4,8% de 2023 a 2026.

Ainda assim, as empresas não desistem da exigência, até porque o país e a Europa enfrentam um contexto especial: “Estamos num quadro extraordinário”, afirma ao Negócios o presidente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP). Em declarações feitas antes da reunião da Concertação Social desta quinta-feira, Saraiva lembrou que o Estado está a “obter excedentes”, quer no IVA quer noutras variáveis, como a Segurança Social, que “está também com excedentes com os quais não contava, porque a população empregada anda na ordem dos 3,8 milhões de pessoas – e é notável

Alimentamos a expectativa de termos alguma redução fiscal, para além de alívio na burocracia e simplificação de processos.

como é que apesar da crise mantemos esta população ativa empregada – e há aí receitas do Estado”.

O “patrão dos patrões” acrescenta que o aumento dos salários (o mínimo e os restantes), e “a sinalização que o Governo trouxe na concertação social para celebrar um acordo social de competitividade e rendimentos” levam

ANTÓNIO SARAIVA

Presidente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP)

Para haver um impacto real nas empresas propusemos um modelo com uma baixa de um ponto no IRC e de 10% das tributações autónomas.

JOÃO VIEIRA LOPES

Presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal

As tributações autónomas introduzem opacidade, imprevisibilidade e instabilidade. São muito negativas para as empresas.

RAFAEL CAMPOS PEREIRA

Vice-presidente executivo da AIMMAP

As tributações autónomas aplicam-se a gastos sem relação com a atividade, quer a empresa tenha lucro ou prejuízo.

a CIP a “alimentar a expectativa de, para aliviar esta situação, termos alguma redução fiscal, para além de alívio na burocracia e simplificação de processos, porque é isso que vai aos custos de contexto”.

António Saraiva admite que “já se percebeu que [a descida da taxa do IRC] não será transversal, com estes episódios das diferenças de opinião entre os ministros” e ironiza que “nas empresas já estamos habituados a isso, a desinteligências entre o diretor comercial e o diretor financeiro”, pelo que “não estranhamos estas questões”. Para o presidente da CIP, a descida tem de acontecer, seja em que formato for: “Tem de haver no IRC alguma redução da carga fiscal, independentemente se é por diferenciação positiva, se é por empresas com determinado cumprimento de tipologias que se venham a definir, mas tem de haver uma redução da taxa nominal do IRC”. O presidente da CIP considera que “em relação às derramas - desde logo a estadual, vale 600 milhões de euros – temos de ter o realismo das contas públicas e da sustentabilidade”.

Tributações autónomas são carga “absurda”

E ainda em sede de IRC, António Saraiva não esquece as tributações autónomas, que incidem sobre as empresas e são calculadas sobre custos e não sobre os lucros:

“Tem de haver uma sinalização de redução da carga absurda que o Estado obtém das tributações autónomas, que têm vindo a subir praticamente todos os anos.”

A CIP tem defendido um corte transversal de dois pontos percentuais na taxa normal de IRC, que deve passar de 21% para 19%, mas neste momento, “uma vez que não é uma redução transversal, temos de saber conjugar pelo total da carga fiscal, entre tributações autónomas, reporte de prejuízos fiscais e apoio ao investimento”. “Não sendo dois pontos de redução do IRC, que no pacote fiscal haja acomodação dessa redução independentemente de se agir neste ou naquele ponto”, resume.

A descida das tributações autónomas é também exigida pela Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), que a conjuga com um corte na taxa nominal. Em entrevista ao Negócios e Antena 1 publicada na última segunda-feira, João Vieira Lopes sustentou que “há um número reduzido de empresas que pagam IRC – cerca de 10% das empresas representam 80% da receita” – e, “por isso, a Confederação tem insistido na questão das tributações autónomas que é a tributação de uma série de custos das empresas que atinge todo o tecido empresarial”. O presidente da Confederação considera que “mexer no IRC neste momento tem interesse até como indicador para o investimento estrangeiro”, mas “para ter um impacto mais real em todo o tecido empresarial propusemos um modelo que podia ser uma baixa de um ponto no IRC e de 10% das tributações autónomas que representam em média 15% do total [de receita fiscal]”.

O setor metalomecânico, um dos mais afetados pela crise energética, também quer ver sinais nesse capítulo: “A questão das tributações autónomas é muito negativa para as nossas empresas e para o investimento”, avisa o vice-presidente executivo da Associação dos Industriais Metalúrgicos, Metalomecânicos e Afins de Portugal (AIMMAP). Ao Negócios – e ainda antes da reunião do Governo com os parceiros sociais que decorreu nesta quinta-feira – Rafael Campos Pereira argumenta que as empresas precisam de “transparência, previsibilidade e estabilidade”, e que as tributações autónomas vão em sentido oposto: “Introduzem opacidade, imprevisibilidade e instabilidade.”

E nesse capítulo – o da estabilidade fiscal como fator de competitividade entre países – lembra um episódio exemplificativo: “Houve um período na altura da troika em que tivemos 62 alterações da legislação fiscal e no mesmo período a Alemanha não teve nenhuma alteração.” Por isso, sustenta que o país precisa “de uma vez por todas estabilizar a legislação fiscal, para que as empresas possam saber aquilo com que contam e nesse âmbito é preciso refazer e repensar o instituto das Tributações Autónomas que de facto são muito negativas para as empresas”.

A AIMMAP não deixa de pedir, no entanto, uma descida da taxa do imposto sobre o lucro das empresas: “É fundamental que a carga fiscal seja aliviada porque tem sido uma tenaz para o crescimento e nesse sentido achamos que o IRC deve descer”, afirma. E quanto? Rafael Campos Pereira admite que reduzir dois pontos percentuais “seja um primeiro um primeiro passo”, mas continua a defender “uma descida generalizada no sentido de mais tarde, em futuros orçamentos, se descer mais, até alinhando com as posições que se prevê que possam vir a ser tomadas pelas cinco maiores economias europeias”, que admitem reduzir o IRC.

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2022-10-07T07:00:00.0000000Z

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