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Ilusões e realidades

JOAQUIM AGUIAR Artigo em conformidade com o antigo Acordo Ortográfico

Otempo é um impiedoso destruidor de ilusões e obriga todos a confrontarem-se com as realidades das sucessivas conjunturas, com o que foram as suas interpretações do que eram as possibilidades políticas. Quando, em 6 de Abril de 2011, o primeiro-ministro José Sócrates anunciou que tinha de recorrer a ajuda financeira externa o que levou à chegada da troika para estabelecer o programa de ajustamento de correcção do endividamento e para controlar a utilização dos 78 mil milhões de euros disponibilizados, era razoável esperar-se que os responsáveis políticos fizessem a sua autocrítica.

Em lugar dessa reflexão, o que se teve foi uma transferência de responsabilidades, onde

“O Orçamento não é de austeridade, porque não a provoca. Vai, isso sim, ser apresentado num contexto de austeridade que não pode evitar.” DANIEL BESSA EXPRESSO 13 DE MAIO DE 2022

as dificuldades financeiras de Portugal eram explicadas pelo domínio das ideias neoliberais e pela rigidez das regras impostas pela União Europeia, em especial o facto de a união monetária não ser uma união de transferências que compense as diferenças de competitividade que antes se resolviam pelo recurso a desvalorizações cambiais. Uma década depois de apresentado o programa de ajustamento, apesar da política acomodatícia do Banco Central Europeu, das suas compras de dívida portuguesa e do seu controlo da taxa de juro, das transferências de fundos, não foi resolvido o principal gerador do desequilíbrio da economia portuguesa, onde as políticas distributivas crescem a um ritmo superior ao que as políticas produtivas e competitivas conseguem promover – o que implica o crónico crescimento da dívida. A austeridade não é uma opção, é uma consequência.

A intencionalidade de austeridade do neoliberalismo reapareceu no que foi a prática política objectiva do que se pode designar como neo-socialismo. Aliás, nem tem de ser uma intencionalidade, é mais provável que se trate apenas da força dos contextos que os agentes políticos não souberam controlar. A honestidade política é uma expressão de valor incerto, mas a honestidade intelectual exige o reconhecimento dos erros sem truques terminológicos.

OPINIÃO

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2022-05-17T07:00:00.0000000Z

2022-05-17T07:00:00.0000000Z

http://quiosque.medialivre.pt/article/281913071713851

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