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À procura de ideias sustentáveis para desenvolver a economia azul

SÓNIA SANTOS DIAS

Ajudar a transferir ideias da academia para o mercado e fazer de Portugal um centro da economia marinha estão na mira do programa de aceleração para start-ups e PME da Fundação Oceano Azul e da Fundação Calouste Gulbenkian. Produtos feitos a partir de algas, de escamas ou de espinhas são algumas das inovações já alcançadas com o programa Blue Bio Value. E agora há novas candidaturas abertas até 30 de maio.

Criar ideias sustentáveis para promover a economia azul é o objetivo do programa Blue Bio Value, uma iniciativa conjunta da Fundação Oceano Azul e da Fundação Calouste Gulbenkian, que lança nova slot de candidaturas, até 30 de maio, para apoiar start-ups e PME nacionais e internacionais que apostem em soluções inovadoras nesta área.

Com 18 vagas por preencher, os vencedores terão acesso a um programa de mentoria de sete semanas, sendo as duas últimas presenciais em Lisboa, e um prémio final para o grande vencedor no valor de 45 mil euros.

Com este programa, as duas fundações pretendem contribuir para o desenvolvimento de novos modelos económicos, mais responsáveis, com impacto positivo na sustentabilidade do oceano, assentes no aproveitamento de recursos marinhos, segundo princípios de circularidade, desperdício zero e descarbonização da indústria.

Esta união surge pela consciência de que “não é possível garantir a sustentabilidade e a preservação dos oceanos sem mudar um dos principais fatores que contribuem para a sua degradação, que é a economia”, refere Ana Brazão, líder do projeto na Fundação Oceano Azul. Na medida em que a população mundial continua a crescer e a exigir cada vez mais recursos, a biotecnologia azul e bioeconomia azul surgem como as respostas que o mundo precisa para explorar os oceanos de for

Não é possível garantir a sustentabilidade e a preservação dos oceanos sem mudar um dos principais fatores que contribuem para a sua degradação, que é a economia.

ANA BRAZÃO,

coordenadora do Blue Bio Value

ma sustentável. “Não podemos continuar a assentar a nossa economia na extração de recursos para a obtenção de matérias-primas. Temos que deixar de recorrer à natureza e temos que começar a fabricá-las nós próprios, e é aqui que vem a grande transformação da bioeconomia, porque a bioeconomia é de base biológica e tudo o que é biológico é renovável”, acrescenta Ana Brazão.

Neste sentido, este programa surge para apoiar start-ups que queiram escalar e também para apoiar ideias que surgem na academia e que precisam de apoio para chegarem ao mercado com esta filosofia subjacente, sendo que, segundo Ana Brazão, o Blue Bio Value “é o único acelerador no mundo focado em biotecnologia azul, o que lhe dá um grau de especialização muito maior, porque acaba por ser muito mais focado em problemas específicos, sobretudo técnicos e tecnológicos, para o desenvolvimento daquelas soluções e que mais ninguém oferece”.

O programa incide no desenvolvimento de competências de gestão e acesso a investidores e infraestruturas, criando mais oportunidades de crescimento para negócios sustentáveis e economicamente viáveis. As candidaturas selecionadas terão acesso a uma rede única de mentores nacionais e internacionais, parceiros especialistas no setor, potenciais clientes e contactos comerciais.

Promover Portugal como centro da economia marinha

Com a elevada plataforma marítima que possui, Portugal já possui muito conhecimento, infraestruturas e centros de investigação ligados ao mar. Com este programa, a Fundação Oceano Azul e a Fundação Calouste Gul

benkian unem esforços para contribuir para que Portugal se torne num polo internacional relevante e inovador no desenvolvimento da mais inovadora bioeconomia marinha, promovendo também uma utilização mais sustentável do oceano.

“Quando dizemos que queremos ajudar a transformar Portugal num centro europeu é porque compreendemos que é preciso proporcionar momentos em que Portugal se promova enquanto tal”, assinala Ana Brazão. “Em Portugal, temos a oferta que qualquer start-up que queira crescer precisa. Aquilo que fazemos atribuindo este prémio é também fazer com que estas start-ups possam conhecer os serviços nacionais, criar parcerias e escalar a partir de cá. E isto também já tem dado alguns bons resultados”, acrescenta a responsável pelo projeto, referindo-se a projetos vencedores de anos anteriores que acabaram por se estabelecer cá.

Uma vez que é de âmbito internacional, este programa permite assim captar ideias em todo o mundo de forma a apresentar-lhes os serviços existentes no país e atrai-las para que assentem a sua operação em Portugal. Para Isabel Mota, presidente da Fundação Calouste Gulbenkian, o programa “tem apostado na valorização do capital natural azul no apoio a iniciativas dedicadas à descoberta de novas utilizações sustentáveis dos recursos marinhos, criando ainda condições para que o mercado absorva as soluções mais inovadoras na área da biotecnologia azul. É um programa que tem colocado Portugal não só num papel de destaque entre os impulsionadores do enorme potencial do oceano, mas também na liderança mundial da bioeconomia e biotecnologia azul.”

Inovação com algas, escamas e espinhas

Desde 2018, o Blue Bio Value já acelerou 59 empresas de 19 nacionalidades que adquiriram competências de gestão de negócios e receberam orientação de mais de 50 mentores. E a partir daqui já muita inovação foi criada nesta área. Cerâmica feita a partir de escamas de peixe, plásticos biodegradáveis criados com espinhas e outros restos de processamento de pescado, têxtil obtido a partir de plantas halófitas encontradas em sapais ou cosméticos com compostos ativos extraídos de algas são alguns dos exemplos de soluções sustentáveis que as duas fundações já promoveram.

A Inclita Seaweed Solutions (ISS), sedeada em Matosinhos, é uma start-up de biotecnologia marinha que contou com o apoio do Blue Biovalue para conseguir escalar o seu negócio.

Dedica-se à extração e produção de ingredientes funcionais a partir de algas marinhas para serem usados na indústria alimentar, de cosmética e de nutrição animal. A empresa, que surgiu inicialmente entre as paredes dos laboratórios do CIIMAR - Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental, surgiu para dar resposta aos pedidos destes mercados que queriam determinados componentes das algas para a composição dos seus produtos e não as algas inteiras por si. Os investigadores e empresários viram então aqui uma oportunidade de fazer a ponte entre os produtores e apanhadores de algas e as indústrias que precisam apenas de determinados componentes específicos das algas. “Vimos que fazia sentido ter uma indústria onde há muito poucas referências a nível internacional. Estamos ali no meio e trabalhamos com todos”, começa por referir Diogo Pena Bastos, managing partner da ISS. Numa lógica de mercado global, explica, “a ideia é não transportar a água das algas e sim os ingredientes o mais preparados possível, de maneira a que o nosso ingrediente seja logo incorporado. Pode, por exemplo, ir em formato de óleo ou de pó, dependendo da aplicação que se queira dar”.

A empresa trabalha com macroalgas recolhidas em Portugal, Espanha e Dinamarca e processa-as para extrair os componentes solicitados. “Estamos neste momento num processo de scale-up. Vamos ter a nossa unidade piloto no início do próximo ano. É uma unidade de piloto já com alguma vontade comercial e depois vamos evoluir para uma fábrica de produção de ingredientes nos próximos três anos”, explica Diogo Pena Bastos, para quem a participação no programa Blue Bio Value foi crucial para dar o salto de Matosinhos para o mundo. “Foi importante para as pessoas que vinham com um background mais de investigação e desenvolvimento perceberem e integrarem dinâmicas de negócio. Outro ponto importante foi terem-nos ajudado a alinhar estrategicamente, a filtrar as oportunidades e a percebermos para onde deveríamos avançar de imediato. Portanto, isso permitiu-nos focar no que são hoje os três segmentos da empresa, a cosmética, a nutracêutica e a petcêutica”, explica o gestor. Este é um dos vários exemplos de empresas que o programa já acelerou e que agora volta a querer captar talento.

A edição de 2022, que será a 5ª, é realizada em parceria com a Bluebio Alliance e dinamizada e implementada pela MAZE. Os 18 vencedores arrancarão com o programa em meados de setembro e estarão presencialmente em Portugal em outubro para a apresentação das suas ideias num pitch. Nesta altura, será eleito o grande vencedor da edição, que receberá o prémio de 45 mil euros, que terá de ser aplicado numa rede de serviços de apoio ao desenvolvimento destes projetos em Portugal.

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2022-05-17T07:00:00.0000000Z

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