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Nutrição em ginásios sem isenção de IVA

Autoridade Tributária tenta pôr um ponto final em dossiê polémico.

FILOMENA LANÇA filomenalanca@negocios.pt

A AT decidiu que as consultas de nutricionismo prestadas nos ginásios não podem nunca ter isenção de IVA. É a resposta a uma situação que já foi parar ao Tribunal de Justiça da UE e ao STA, mas que, dizem os fiscalistas, não respeita estas decisões. Por isso, “a saga vai continuar”.

“As prestações de serviços efetuadas por profissional certificado e habilitado para o efeito que correspondam ao acompanhamento e aconselhamento nutricional realizado em ginásios ou em outros estabelecimentos desportivos” não se encontram abrangidas pela isenção prevista pelo código do IVA para as “profissões de médico, odontologista, psicólogo, parteiro, enfermeiro e outras profissões paramédicas”. Também não terão direito à isenção as prestações de serviços de nutricionista que “tenha sido contratado por entidade que se dedica à prestação de serviços de acompanhamento de atividades desportivas”.

A decisão consta de um documento interno da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) assinado há poucos dias por Miguel Nuno Gonçalves Correia, subdiretor-geral para a Área de Gestão Tributária do IVA. Desta forma, lê-se no documento, “ficam revogadas todas as orientações da AT que contrariem o presente entendimento”.

O Fisco vem, assim, pôr um ponto final numa polémica que se arrasta há vários anos pelos tribunais e sobre a qual já se pronunciaram o Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) e, no início deste ano, o Supremo Tribunal Administrativo (STA). Esta decisão, porém, vai além do que decidiram os tribunais, consideram os especialistas ouvidos pelo Negócios. E, assim sendo, concluem, “a saga vai continuar”, ou seja, mantém-se campo fértil para a litigiosidade.

Em causa estão aquelas situações em que, conjuntamente com os normais serviços de desporto, os ginásios disponibilizam aos seus clientes o acesso a consultas de nutricionismo. A AT tem considerado que as consultas são acessórias da prestação principal, relacionada com a atividade física, e que, por isso, não lhes seria aplicada isenção, mas sim o IVA à taxa normal que os ginásios pagam. Estes têm impugnado em tribunal as liquidações adicionais feitas pelo Fisco e são inúmeros os casos que têm chegado à arbitragem, num braço de ferro que se arrasta pelo menos desde 2016.

No ano passado, um deles chegou ao TJUE, que concluiu que nada impede os ginásios de disponibilizar consultas de nutricionismo aos seus clientes e separar as duas atividades para efeitos de IVA, ficando as consultas de nutrição isentas desde que os ginásios comprovem que estas têm efeitos terapêuticos.

Já este ano, um acórdão do STA, uniformizador de jurisprudência, veio afirmar que não haveria lugar à isenção, mas não se debruçando sobre a questão de haver ou não fins terapêuticos, já que esta não foi invocada pelos ginásios envolvidos.

E são estas duas decisões que o Fisco agora toma por base para afastar de vez a possibilidade de isenção. Ora, entende Sérgio Vasques, fiscalista especialista em impostos indiretos, “o que a AT está a fixar como doutrina administrativa não corresponde ao que resulta da decisão do TJUE nem do STA”, na medida em que, pura e simplesmente, “está a presumir que as consultas de um nutricionista que trabalhe num ginásio, por definição, nunca têm finalidades terapêuticas”.

“Não se pode dizer que uma consulta de nutrição num consultório ou numa farmácia é isenta de IVA e outra igual, num ginásio, já não é, mesmo que siga todas as regras da profissão, tenha fins terapêuticos e seja até prestada pelas mesmas pessoas”, acrescenta Clotilde Palma, especialista em IVA e professora universitária. Na sua opinião, este entendimento da AT “viola o direito da UE”. Porquê? Porque, sendo “discriminatório, viola o princípio da neutralidade do imposto, um princípio sacrossanto do IVA” e que deve ser respeitado não só pelo legislador, mas também por quem aplica a lei, no caso, a AT.

Sérgio Vasques concorda: “A doutrina produzida pela AT tem de estar conforme à jurisprudência comunitária” e “se for a partir

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2022-05-17T07:00:00.0000000Z

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