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Ocidente não deve cair numa ratoeira ao estilo da Guerra Fria

DARON ACEMOGLU

Trabalhar muito, por si só, não garante nada. Muita boa gente trabalha muito e não consegue nada de especial. Justificar o sucesso com muito trabalho, geralmente, é apenas uma parte da história. Na maioria dos casos é um engano e não ajuda uma pessoa a tornar-se mais capaz.

Trabalhar muito, dedicada e intensamente, é importante para fazer as coisas bem e ir longe, mas não chega. Basta olhar para os atletas olímpicos: todos trabalham muito, há anos, muitos anos, tanto os que ganham as medalhas de ouro como os que ganham as de bronze, como os que são eliminados na primeira prova. Entre profissionais competentes todos trabalham muito. O problema é que há muita gente mediana e outro tanto incompetente que também trabalha muito.

Só por si, trabalhar muito não torna uma pessoa melhor. Aliás, existe alguma evidência de que, sem se aprender nada de novo, entrando em piloto automático, trabalhar muito não só não ajuda a ficar melhor como é o caminho para se ficar pior – basta trabalhar mal e muito.

O tempo não traz necessariamente qualidade. Existem registos em muitas profissões de especialistas ultrapassados por estudantes e de profissionais em início de carreira melhores do que profissionais experimentados. Por exemplo, dois estudos sobre auscultação cardíaca, levados a cabo no âmbito da clínica geral, sugerem que a qualidade do desempenho diminui à medida que o tempo passa. Antes destes estudos, realizados há alguns anos, admitia-se que a competência na auscultação cardíaca, como em muitas outras tarefas, subiria nos primeiros anos de prática, estabilizando a partir daí. Estes estudos mostram, no entanto, que a competência avança apenas nos primeiros dois a três anos de prática profissional e que ao fim de dez anos começa a descer, colocando-se abaixo da de quando se iniciou a carreira. A qualidade não resulta da experiência. Trabalhando muito, mas em piloto automático, poupa-se energia, ignora-se erros, mas não se acrescenta valor ao que se faz, nem se melhora.

A performance excepcional assenta não em trabalhar muito, ou apenas em trabalhar muito, mas em trabalhar bem: em trabalhar e aprender, aprender e melhorar, decidir e não adiar, não analisar as mesmas coisas duas e mais vezes, focar o que faz a diferença, inovar, e a cada dia, cada mês, cada ano, garantir que se fica mais competente, mais capaz, mais forte.

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2021-07-30T07:00:00.0000000Z

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