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“Dei palestras do hospital“

FILIPE MARTINS E A SUBIDA À LIGA PRINCIPAL

MIGUEL AMARO

O que leva um treinador que tinha estado na 1ª Liga, com o Feirense, a aceitar um ano depois o convite do último classificado do segundo escalão?

FILIPE MARTINS – Foram dois factores. Primeiro, a história de um clube como o Casa Pia, mas acima de tudo o que me convenceu foi a conversa com o Tiago Lopes, o nosso CEO, que me propôs um projeto de três anos para colocar a equipa na 1ª Liga. Projeto apresentado com grande convicção e a garantia de haver capacidade financeira para o alimentar. Eram objetivos arrojados. Disse logo que era preciso mudar mentalidades porque nunca passaria pela cabeça de alguém que aquele Casa Pia, após duas épocas, chegaria à 1ª Liga ao fim de 83 anos.

Na experiência anterior na 1ª Liga chegou ao Feirense já na 2ª volta. Dá mais gozo chegar à 1ª num projeto como este?

FM - Claro que sim. Este projeto foi como criar um bebé, foi começar tudo do zero. Juntamente com a minha equipa técnica e com a criação de um departamento de scouting.

Era um projeto a três anos, mas só precisaram de dois para subir. Como foi possível?

FM - Fomos encurtando caminho. Organizamo-nos muito bem. Quando chegámos aqui, a 1 de setembro de 2020, não tínhamos nada. Ou melhor, eram 5 jogadores com contrato, mas desses eu não queria todos e outros não queriam cá estar. Acabaram por ficar só dois no plantel, o Kelechi e o Van der Laan. Começámos um projeto mesmo de início.

Como conseguiram contratar perante essa desconfiança que havia em relação a um projeto ainda desconhecido?

FM - A ideia foi contratar alguns jogadores com algum nome na 2ª Liga para esses servirem de chamariz para os outros. Vieram o Christian, que tinha estado comigo no Feirense, o Romeu Ribeiro e o Ricardo Batista, por exemplo, e acabaram por mostrar aos outros que estava aqui um projeto diferente. No mercado de inverno já sentimos outra recetividade dos jogadores e na época seguinte já queriam vir para cá. Nada melhor do que o ‘passa palavra’ dos jogadores. Além do plantel, organizámo-nos muito bem. Temos um excelente team manager [Pedro Correia], o departamento de comunicação melhorou e a própria imagem do clube. Basta ver como as instalações mudaram. Há ex-jogadores que voltam aqui e não reconhecem o clube. O aspeto em que fizemos mais a diferença foi na organização. Vou dar um exemplo: em tempo de Covid, os jogadores acabavam de treinar e tinham aqui refeições para levarem para casa, para não terem de ir a supermercados. Não tinham de se preocupar com nada, só tinham de estar focados no trabalho.

Falaram em três anos, mas subiram em dois. Houve um discurso para fora do clube e outro interno nesse sentido?

FM - Sim, claramente. Agora já o posso revelar. Este plantel tem jogadores que queriam essa pressão, mas outros nunca tinham estado em ligas profissionais. Tivemos de jogar com isso, não levantar grandes ondas. Até para não dar ideia de frustração se não conseguíssemos subir.

Não abanaram quando perderam três jogos seguidos em dezembro, sendo um deles na Taça?

FM - Não. O grande clique para a subida foi a mudança de sistema, de 4x2x3x1 para o 3x4x3. Havia jogadores que não estavam a ser potenciados e depois de mudarmos melhoraram muito. Além disso, mesmo quando foram as três derrotas seguidas, a mensagem que veio de cima foi positiva, para nos focarmos no trabalho.

O Casa Pia passou 20 jornadas em zona de subida direta. Isso prova a justiça da subida?

FM - Acho que sim. Fizemos uma média de dois pontos por jogo, no campeonato mais competitivo dos últimos anos. É completamente justa a subida.

“FIZEMOS MÉDIA DE 2 PONTOS POR JOGO NO CAMPEONATO MAIS EQUILIBRADO DOS ÚLTIMOS ANOS. A NOSSA SUBIDA É JUSTA”

“NÃO FOMOS INFERIORES AO RIO AVE, MAS PARABÉNS PELO TÍTULO. QUEM TERMINA EM 1º É SEMPRE UM JUSTO CAMPEÃO”

Quando perderam em Vila do Conde e caíram para 3.º temeram só chegarem ao playoff?

FM - Uma vitória lá dava-nos logo a subida, mas perdendo sabíamos que com mais duas vitórias subíamos. Perdemos os dois jogos com o Rio Ave, mas não nos sentimos inferiores a eles. Digo isto mas dou-lhes os parabéns pelo título. Quem termina em 1º é sempre um justo campeão.

Na época passada subiram Estoril, Vizela e Arouca, que não mexeram muito nos plantéis e agora conseguiram a permanência. Bons exemplos para vocês?

FM - Acho que sim. O Vizela mudou alguns, mas manteve a base; o Arouca é que mudou pouco. A questão é que a diferença entre equipas de 1ª Liga que lutam pela permanência e as da 2ª que lutam para subir não é assim tanta. Temos que fazer ajustes, mas não vamos mandar toda a gente embora. Não gosto do rótulo de jogadores de 1ª. Veja-se o Kiko Bondoso [Vizela], que veio do 3º escalão.

O Casa Pia também tem exemplos desses?

FM - Tem. O Lelo, que se estreou no futebol profissional, o Jota vai ter impacto na 1ª Liga e o próprio Sanca também está preparado.

Então não vão precisar de muitos reforços?

FM - Não faremos uma revolução, mas temos de nos apetrechar muito bem, em termos de qualidade. Temos de fazer um grupo competitivo para começar a cimentar o Casa Pia na 1ª Liga.

O plantel precisa de reforços e o Filipe Martins, agora com 43 anos e a voltar à 1ª Liga três épocas depois, é hoje um técnico mais preparado para este escalão?

FM - Penso que sim. Na altura do Feirense foi uma decisão intempestiva, fruto da inexperiência como treinador. Havia coisas de que ainda não tinha bem a noção. Quando ainda não passámos por certas experiências pensamos que é só chegar lá e mudar as coisas como se fosse magia. Hoje estou muito melhor preparado.

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2022-05-17T07:00:00.0000000Z

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