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3.º Setor -A mudança de mentalidade que se impõe

LUÍS MIGUEL HENRIQUE Advogado Coluna semanal à sexta-feira

Por norma e simplificação de linguagem, costumamos designar de “3.º Setor”, “setor social” ou de “Economia Social” o eixo da economia onde entidades privadas (as não vinculadas à Administração Pública) não têm como objetivo principal o lucro, mas sim a prestação de serviços em áreas de relevante interesse público, onde o Estado não consegue atuar e/ou cobrir, total ou parcialmente.

Nas últimas semanas, fruto da iminente falência de uma das IPSS mais relevantes do concelho do distrito de Setúbal onde resido, acabei por ter um maior e melhor contacto direto com a realidade do dia a dia destas organizações, assim como pelos interesses muitas vezes instalados à volta das mesmas.

De uma vez por todas (aproveitando até o facto do atual ministro da pasta da Economia voltar apelar ao fim da demonização do lucro em Portugal), é realmente importante que as pessoas, sejam elas singulares ou coletivas, públicas ou privadas, interiorizem de uma vez por todas que, também no 3.º setor, o “resultado financeiro positivo no final de cada exercício” (para não lhe chamar lucro ou superavit), tem de ser um objetivo primordial a alcançar.

Para tal, independentemente das motivações puramente altruístas que muitas das vezes presidem à motivação de cada um que ali se envolve, há princípios profissionais de gestão e de organização empresarial, que não apenas se recomenda a sua implementação, como são condição “sine qua non” para uma forte sustentabilidade necessária destes importantíssimos projetos sociais.

Sem independência financeira não existe independência intelectual. É uma verdade para cada um de nós, individualmente considerado, mas é também e cada vez mais, uma verdade para uma grande parte das IPSS que acabam por ser capturadas por interesses muitas vezes obscuros e pouco transparentes de uns quantos, quando não muito do próprio aparelho do Estado.

Cria-se assim uma relação de dependência, redutora do papel da economia social e solidária.

A ligação entre o Estado (seja através do poder central ou local) e as IPSS de forma “interesseira” que cada vez mais se vislumbra, em vez de genuinamente “interessada”, tem claramente de arrepiar caminho.

Ainda que o Estado encontre aqui uma forma de diminuir a sua intervenção, é importante que estas organizações não sejam meros entrepostos de emprego e influência para alguns “boys and girls” da cor certa.

Obviamente que cada vez mais nos importa os conceitos académicos do “New Public Management”, pelo que também no setor da economia social estes deverão presidir.

A cooperação entre o Estado, os agentes de mercado e o movimento associativo é cada vez mais primordial e cada um destes entes tem a sua quota-parte de culpa no que tem falhado e de responsabilidade naquilo que pode e deve ser feito.

Ao Estado e seus agentes, compete criar as condições e o ambiente para que esta cooperação efetiva e interessada exista, não promovendo a dependência económica com o interesseirismo político de criar “centros de influência” local ou nacional.

À empresa, cada vez mais e particularmente no mundo ocidental, capitalista e democrático, compete-lhe o papel ativo de saber promover e contribuir para o espaço da responsabilidade social.

Contudo é ao agente da Economia Social que a verdadeira mudança de mentalidade se impõe.

De uma vez por todas, a adoção de fundamentos de gestão eficazes e eficientes, métricas transparentes das suas valências e conquistas, modelos de governação sérios e transparentes e a dotação de uma real estratégia de comunicação que saiba valorizar as suas marcas, obras e parceiros têm de ser o caminho a seguir.

É essa a ( grande) mudança de mentalidade que se impõe ao terceiro setor.

Também no setor da economia social o superavit deve ser um objetivo primordial.

A ligação entre o Estado e as IPSS de forma “interesseira” que cada vez mais se vislumbra, em vez de genuinamente “interessada”, tem claramente de arrepiar caminho.

OPINIÃO

pt-pt

2023-03-24T07:00:00.0000000Z

2023-03-24T07:00:00.0000000Z

http://quiosque.medialivre.pt/article/282265259677268

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