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A ECONOMIA VISTA DE MOLEDO

Há cada vez mais estrangeiros a instalar-seno Alto Minho. O preço dos terrenos é baixo e o País tem fartura de ruínas, de pinhais onde se respira o arde outrora e de boa comida nas províncias. O Dr. Paulo achaque istoé um adas variantes do“destino português ”: ir arrendando o mapa a quem tem dinheiro para se instalar no meio de gente pitoresca e cordata. Ele acha que, apesar de tudo, o Alto Minho será mais poupado, porque tem uma vantagem sobre o resto do País, queé os euclim apouco democrático, feito de verões moderados e neblinas matinais que não cativam muito os americanos e franceses que gostavam de viver em Itália ou na Côte d’Azur, mas já chegaram tarde. Restamos nós, e por bom preço. Alguns deles instalam-se nas redondezas e fazem “florescer a economia”.

Os meus dois irmãos economistas consideram isto uma “vantagem competitiva”: temos um “manancial de oportunidades” e por bom preço, o que significa que daqui a alguns anos os vindouros (entre os quais os meus sobrinhos) se darão conta de que uma parte do País não lhes pertence, mas sim a turistas que vieram e apreciaram bastante a paisagem, o arroz de pato, o peixe fresco, as aguardentes de Monção e de Melgaço, algumas coisas de baixa qualidade, e certa deferência camponesa – e ficaram porque tinham bolsa farta num País apenas remediado. Nesta idade (sou o muito mais velho dos cinco irmãos, três rapazes e duas senhoras) não tenho paciência para lhes opor argumentos, talvez porque, a partir de determinada altura, deixamos ou de entender o mundo, ou de nos interessarmos por ele, já que se percebe que as coisas decorrem perfeitamente sem a nossa intervenção ou sem o nosso horror. O velho Doutor Homem, meu pai, pedia que deixassem a Tia Benedita em paz e não discutissem com ela – porque o seu mundo terminara há muito, os seus receios eram infundados, e a sua vida não incomodava o curso das coisas nem a forma como “as novas gerações” escolhiam a maneira de vestir, de escolher uma profissão, de habitar uma casa ou de destruir um amor. Ora, eu sou a Tia Benedita para os tempos da democracia.

A diferença é que, ao contrário da matriarca miguelista dos Homem, que detestava o futuro e sofria ao pensar no passado (que estava cheio de derrotas), eu dedico-me a revisitar os álbuns de família sem sentir qualquer amargura diante daqueles momentos de felicidade vividos há 40, 50, 60 anos, e que são apenas uma ténue corrente de ar que percorre a casa e a deixa – também ela – indiferente.

Enquanto se senta no cadeirão da varanda a apreciar estes momentos de um Outono mais ou menos tépido, o Dr. Paulo, com a sua alma de empresário, recomenda que não me incomode com as notícias da economia. Pela forma como contempla os pinhais de Moledo, eu diria que ele anda afazer contas por alto.Éonoss odes tino. ANTIGA ORTOGRAFIA

“O preço dos terrenos é baixo e o País tem fartura de ruínas

CRÓNICA

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2021-10-17T07:00:00.0000000Z

2021-10-17T07:00:00.0000000Z

http://quiosque.medialivre.pt/article/283854396520594

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